quarta-feira, 15 de outubro de 2014

Meus centavos sobre o dilema do segunto turno

diante das duas opções que temos no segundo turno das eleições a presidente, não é difícil se sentir desamparado e sem muita escolha. 

no meu caso, em hipótese nenhuma votaria no candidato do psdb, pela sua biografia, por oposição a algumas de suas propostas, pelo histórico de seu partido e por quem está ao seu lado (se o Malafaia e o Bolsonaro estão lá é sinal de que eu não estou...). questão de posicionamento ideológico mesmo.

por outro lado, me vejo profundamente desiludido e cético em relação à continuidade do petismo. não nego suas qualidades e também reconheço o quanto que a grande mídia bate sem dó no atual governo (e incita uma raiva quase irracional de uma parte da população). acontece que não dá pra fechar os olhos para todos os problemas que vem bater à sua porta: a infeliz flexibilização programática, o abandono de bandeiras históricas, as alianças escusas com antigos inimigos e principalmente a tolerância com a corrupção. pra piorar, em alguns pontos ambos os lados têm comportamentos muito parecidos e detestáveis, se articulando através do financiamento vultoso de grandes empresas, projetos de marketing agressivos e manipuladores e muita sede de poder.

outro ponto que irrita é o fanatismo dos dois lado da disputa. analistas políticos de facebook demonizam o candidato adversário com uma ignorância e virulência de fazer corar qualquer pessoa mais sensata. no anseio de justificar seu posicionamento tornam a política uma briga de feira sem sentido.

dito isso, considero fortemente a opção de se votar nulo. discordo categoricamente de quem diz que essa é uma solução que "renega a democracia" ou de quem "não quer se dar ao trabalho de participar do processo democrático". pelo contrário, acredito que, na medida em que o voto nulo ou em branco são opções próprias do nosso sistema eleitoral, é natural que uma porcentagem dos eleitores optem por elas. ao se votar nulo/ branco se manifesta uma vontade política democrática, passa-se uma mensagem tanto quanto quem vota neste ou naquele candidato. contra aqueles que dizem que "um dos dois vai acabar ganhando", digo, deixe que ganhem. é próprio do sistema que isso aconteça. porém, há momentos em que não se pode simplesmente fazer concessões e um voto "em cima do muro" ou que "lave as mãos" acaba sendo mais representativo da nossa vontade individual e essa é a essência da coisa.

confesso que dada o atual cenário, ainda não estou certo de que votarei nulo, afinal também não descarto a validade de um voto crítico, relacional e de oposição. porém, não gosto do tom alarmista que se emprega para tentar convencer alguém a votar neste(a) candidato(a) ou senão uma coisa muito grave vai acontecer caso o(a) outro(a) seja eleito(a). nem sempre o "inimigo do meu inimigo é meu amigo". às vezes precisamos mesmo é nos desvencilhar dos dois.


2 comentários:

[eneá-tê] disse...

Eu gosto das suas análises ponderadas e críticas. Concordo com o que você disse: desde a irritação com o fanatismo até a discordância do lado A e decepção com o lado B.

Meus pessoais centavos são os seguintes:

Tenho muitas dúvidas sobre os efeitos reais dessa manifestação em forma de voto nulo. Ao mesmo tempo que me atrai a simbologia implícita, ficou um pouco incomodada com a idéia de me abster quando discordo veementemente de pontos que me deixam de fato alarmada quanto àquele "inimigo do meu amigo". E eu sei que essa é a lógica que opera na coisa irritante que é o fanatismo, mas quando o "inimigo" é um cara que caga regras sobre como eu vou viver a minha vida (porque me afeta direta e pessoalmente a tal da ideologia à qual você se opõe) eu não fico confortável com a abstenção. É a idéia do voto não como uma coisa representativa, mas como uma contribuição direta pra uma ordem social. Ok, ilusões da falsa matemática que eu comprei da democracia, assumo.

Às vezes me parece tudo um grande jogo em que nem o voto nulo interfere, nem o voto pensado como válido para mudar as coisas. Entendo e gosto de pensar que a política se faz no dia a dia... e também que as outras instâncias de poder também acabam tendo muita importância pra ordem das coisas, talvez até mais do que aquele figurinha que fica na presidência e deveria me representar. Mas eu não me sinto devidamente representada em boa parte do tempo em que passo nessa tal de sociedade: não me sinto confortável no meu trabalho, ou em outras situações do cotidiano em que sou bombardeada por comentários homofóbicos, racistas, machistas e elitistas; não me sinto contemplada quanto a atual ordenação das questões de gênero, nem na escala macro, nem na escala micro; não concordo com uma série de coisas que vão desde à como a educação é pensada até como as coisas que me são vendidas são produzidas (por exemplo: o teste em animais) na lógica capitalista, entre outras coisas das quais resmungo bastante.
(...)

[eneá-tê] disse...

(Continuando; muitos caracteres)

Então no final das contas, me parece que nosso papel acaba sendo mais de aposta, mesmo, quanto às eleições. Uma espécie de desperdício de energia. Talvez como quando pensamos que deixar de comer carne e deixar de utilizar produtos de origem animal também não muda nada no quadro geral (apesar dos bons argumentos do veganismo), deixar de consumir a marca y porque usa trabalho infantil, deixar de usar o produto jota porque fez uma campanha contra meus valores, como pensamos que tentar explicar pra gente religiosa o que existe de intolerante / discurso de ódio no que entendem como "a verdade" ou a "vontade divina" também será inútil e outras situações em que o que nos parece absurdo é perfeitamente normal e culturalmente estabelecido pra maioria das pessoas. Tudo isso me cansa bastante. E penso que as coisas nunca serão do jeito que eu acho que elas devessem ser, e no máximo eu só posso sustentar a ligeira esperança de que elas não caminhem mais pros lados do que me parece absurdo, ou até mesmo "retrocesso", numa perspectiva de avanços sociais.

Mas é isso. No final das contas a gente quer mesmo é uma solução que nos deixe contente com nós mesmos. Queremos uma resposta otimista. Queremos pensar que vai ficar tudo bem, independentemente do que aconteça. Acho que eu gostaria de acreditar que vai ficar tudo bem independentemente do que aconteça; gostaria de pensar na política em termos evolutivos quase como a ciência é otimista quanto à evolução natural do mundo, nos dizendo que estamos caminhando pro melhor, independentemente da ação ou da vontade humana. Talvez pensar na história e na diversidade social contemporânea mundial não me permita me abster.

Por mais que seja uma ação inútil, que seja uma ação na intenção do que eu quero e acredito ser remotamente possível. O meu problema com o voto nulo é a falta de futuro válido e possibilidade de mudança que ele me apresenta. Me falta fé na simbologia do voto nulo como algo que tenha uma repercussão positiva e me falta conhecimento de situações anteriores em que isso deu algum tipo de lição (efeito válido para uma ação simbólica do ponto de vista social ) para a sociedade como um todo. Acho que o último ponto é que minha consciência particular fica mais tranqüila com um voto crítico (não totalmente de acordo), um pouco forçosamente otimista, mas certamente em defesa de uma ordem das coisas menos absurda pro futuro de acordo com o que eu acredito.