quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

a paixão quase enlouquecida

"Para que os indivíduos saiam de uma certa inércia, tomem iniciativas e ajam, nas condições de ceticismo e desconfiança que se difundiram na época contemporânea, eles precisam reconhecer e assumir resolutamente seus interesses. E tem mais: quando um determinado interesse particular se sobrepõe aos demais, é preciso que nele se concentre toda a energia do sujeito, e os outros interesses cedem espaço ao interesse principal, que se caracteriza, então como paixão."

(KONDER, Leandro. Sobre o Amor. pág. 67, São Paulo : Boitempo)
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Achei particularmente inspiradora a maneira como Leandro Konder expõe a visão hegeliana acerca da paixão: ela seria "a exasperação de um sentimento necessário à obtenção de algo", uma força criadora, que impulsiona o ser humano a buscar um determinado objetivo entre tantos possíveis e, arrisco dizer, "realizar-se enquanto sujeito". Segundo Hegel "nada de grande se realizou no mundo sem paixão" e me parece razoável atribuir à ela essa capacidade de conquistar, construir, destruir e reconstruir, transformar as coisas ao nosso redor ativamente, deixando, acima de tudo as marcas da nossa passagem pela vida, por mais insignificantes que sejam do ponto de vista da História.

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

"As batalhas de identidade não podem realizar a sua tarefa de identificação sem dividir tanto quanto, ou mais do que, unir. Suas intenções includentes se misturam com (ou melhor, são complementadas por) suas intenções de segregar, isentar e excluir. Há apenas uma exceção a essa regra (...) a verdadeira e plenamente includente identidade da raça humana."

(BAUMAN, Zygmunt; "Identidade", págs. 85 e 86).
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penso muito nisso: o quanto é arriscado aprofundar diferenças, destacar o grupo em relação à sociedade (ou a humanidade) como um todo. levantar barreiras que deixem claro que, daqui pra dentro compartilhamos identidades, somos iguais e nos reconhecemos como tal, enquanto lá fora o que paira é a desconfiança e a insegurança dos "outros". quase sempre esse posicionamento vem acompanhado de um processo de auto-afirmação, de evidenciação das qualidades do "meu grupo" em detrimento do restante. vemos isso no que tange à religião, futebol, política, nacionalidade, gosto musical... enfim, parece que qualquer característica que nos aproxime de uns, forçamente nos afasta do restante e se não tomarmos cuidado faz com que os menosprezemos baseado em preconceitos e estigmas.

claro que as relações sociais funcionam assim, um processo contínuo de criar identidades com uns e diferenças com outros, desde os assuntos mais banais até questões que envolvem toda a vida do indivíduo e até suas concepções sobre o além-vida. o que me preocupa é cristalizar essas diferenças de tal maneira que se perca de vista o caráter frágil e menor dessas identidades. no meu ponto de vista, nada se sobrepõe ao fato de compartilharmos a identidade humana, por mais que estejamos inseridos (por opção ou contra a vontade) em identidades opostas e mutuamente excludentes, não vejo nenhuma justifica para fazer disso um guerra, ou um motivo para o ódio ou a intolerância.

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

Arte, Inimiga do Povo


Desde o título, esse livro, que releio agora, cinco anos depois, se mostra polêmico e muito instigante. Se tem uma ideia que dificilmente questionamos é o caráter pretensamente universal, sublime e superior daquilo que é considerado arte em nossa sociedade. Mesmo as pessoas que não se identificam com ela, aprendem a reconhecê-la como uma manifestação elevada à qual somento pessoas de espírito superior têm acesso. Dominar seu conhecimento, possuir a sensibilidade para contemplá-la é coisa para poucos.

O autor busca desconstruir o quase consenso que paira sobre o assunto, ao demonstrar que essa noção (do que é ou não é arte) se desenvolve historicamente, em condições sociais específicas e é mascarada através de um discurso que defende a universalidade e a plenitude da arte enquanto realização do ser humano. Em suas palavras:  "[a arte] não passa de uma grande farsa, um jogo de cena das classes dominantes para vender seu estilo de vida como algo superior e elevado". Ou seja, há um direcionamento ideologico de um grupo de pessoas auto-interessadas, que confere tal classificação as suas próprias preferências e a usa como um símbolo distintivo de classe. Convencem, através de uma suposta legitimidade auto-conferida, que falam em nome da humanidade que isso e não aquilo é arte e que portanto é algo a ser apreciado e valorizado como tal. Assim, até mesmo aqueles que criticam a ideologia burguesa de alguma forma acabam endossando sua visão.

Não posso deixar de concordar que a "alta cultura" só é superior de maneira muito artificial e questionável e é usada para menosprezar as práticas e preferências do restante da população. Somos bombardeados o tempo inteiro e de maneira quase imperceptível sobre o que tem qualidade e o que é porcaria no âmbito da cultura. E a própria massa, de maneira geral, apesar de não se sentir atraída pelo hábito culturais da elite, aceita e dissemina essa noção dando a ela um tratamento respeitoso e reverente, como "coisa de gente culta". Escritores, pintores, compositores são manipulados como símbolo de distinção de classe.

O autor propõe, a partir dessa desmistificação, uma "ofensiva popular", que negue qualquer traço de superioridade do mundo da arte, não apenas por ser falsa, mas  "porque é parte integral da opressão social infligida à maioria das pessoas". (p. 32)


quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013

JUBILEU (excertos)




"(...)
                        me apresento, se me permite:
                                                                      - Maiakóvski.
Dê-me a mão!
                        Eis a jaula do tórax.
                                                        Ouve?
                                                                   Não vibra, -
gane,

(...)

"Não,
          não vou impor
                                os meus humores negros,
já não quero falar,
                                e com quem falaria?

(...)

"O sonho é dano,
                          a fantasia inútil,
é preciso
               arrastar
                           as rotinas do tédio.
Mas ocorre
                   que a vida
                                    tome um perfil inédito,
e revele
             a grandeza
                               através do que é fútil.

(...)

"Nós dois
              contra o lirismo,
                                       baioneta calada,
buscamos
                 a nudez
                              da palavra precisa.
A poesia,
               porém,
                           é uma não-sei-que-diga,
largada por aí,

(...)

"É preciso
               que o poeta
                                  seja mestre da vida."

(...)

"Odeio
            a morte e seu mortiço.
Adoro
           aquilo que é vida."

(Vladímir Maiakóvski)