segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

I.

eu sei, você me queria morto...
meu corpo estendido no chão seria poesia
sua obra-prima, tão pungente e pessoal.
cada membro compondo uma estrofe,
vísceras e sangue numa rima perfeita

o lirismo atormentado que só você veria
nos olhos muito abertos e vazios
na boca congelada num sorriso
na pele lívida de quem, entediado,
se prepara para ser defunto e fantasma

você lamentaria pela morte prematura?
ou por não poder me infligir uma dor renovada?
saber que descansarei eternamente cínico,
enquanto você sofreria de remorso e impotência?
(apreciaria uma vez mais a obra que tanto desejou?)

II.
leio o desejo de crime em teu semblante
capto a luxúria homicida a me espreitar
você hipnotizada ao imaginar o meu cadáver
enrubescida, excitada pelo pensamento mórbido...
(desarmo-te, avanço, toco a pele em brasa.)

entrega-se, trêmula, sussurra uma confissão.
convenço-te a, pelo menos esta noite,
desistir da pulsão poético-homicída
e aceitar feliz a vida que brota em mim
e te sequestra indecorosa e te domina.

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"ah, mas isso era antes"

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