Eu, filho do carbono e do amoníaco,
Monstro de escuridão e rutilância,
Sofro desde a epigênese da infância,
A influência má dos signos do zodíaco.
Profundissimamente hipocondríaco,
Este ambiente me causa repugnância...
Sobe-me à boda uma ânsia, análoga à ânsia
Que se escapa da boca de um cardíaco.
Já o verme - este operário das ruínas -
Que o sangue podre das carnificinas
Come, e à vida em geral declara guerra,
Anda a espreitar meus olhos para roê-los,
E há de deixar-me apenas os cabelos,
Na frialdade inorgânica da terra!
(Anjos, Augusto dos)
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Agrada-me a força e a obscuridão que impregna seus versos, como se cada um deles fosse de ferro e doesse de verdade em contato com os olhos. A visão desiludida com que representa o mundo, em sua frieza orgânica e a implacável mecanicidade com que tudo perece, ausente qualquer encanto. Irrita-me supor que esteja certo e que tudo não seja nada além do que há de repulsivo nessa terra, que minha carne seja menos (muito menos!) do que me faz crer a ingenuidade que me persegue. Que minha psicologia seja a de um vencido e que sobrará de mim apenas os cabelos.
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