quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Mais algumas linha sobre capitalismo e meio ambiente

"A taxa de desenvolvimento devia ser reduzida ao 'sustentável' a médio prazo- o termo era convenientemente sem sentido - e, a longo prazo, se chegaria a um equílíbrio entre a humanidade, os recursos (renováveis) que ela consumia e o efeito de suas atividades sobre o ambiente. Ninguém sabia e poucos ousavam especular como se devia fazer isso, e em que nível de população, tecnologia e consumo seria possível um tal equilíbrio permanente. Os especialistas científicos sem dúvida podiam estabelecer o que se precisava fazer para evitar uma crise irreversível, mas o problema de estabelecimento desse equilíbrio não era de ciência e tecnologia, e sim político e social. Uma coisa, porém, era inegável. Tal equilíbrio seria incompatível com uma economia mundial baseada na busca ilimitada do lucro por empresas econômicas dedicadas, por definição, a esse objetivo, e competindo umas com as outras num mercado livre global. Do ponto de vista ambiental, se a humanidade queria ter um futuro, o capitalismo das Décadas de Crise não podia ter nenhum."

(HOBSBAWN, Eric. 1994. Era dos Extremos: O Breve Século XX, pág. 548. Editora Companhia das Letras)
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Resolvi citar toda essa parte ainda do mesmo livro do Hobsbawn, por que vai bem ao encontro do que eu havia escrito anteriormente sobre a questão ambiental em sua relação com a economia capitalista mundial.

Começa por sua observação ao termo "sustentável" e toda sua falta de sentido prático (o que favorece quem quer dizer algo relevante, mas sem se comprometer com resultados). Mesmo escrevendo no início da década de 90 tal palavra parecia já estar bem em voga. Hoje em dia então, ela (e mais ainda a expressão "desenvolvimento sustentável") faz parte de qualquer retórica que pretenda convencer que é possível uma convergência entre o crescimento da economia e a preocupação ecológica. Apesar de, como já expus anteriormente, considerar que os discursos e as práticas ecologicamente corretos serem muito mais ação de marketing do que efetivamente uma preocupação corporativa. Ou ainda, mesmo que seja realmente uma preocupação, acho difícil que se sobreponha aos aspectos econômicos, de maximização de lucros, quando ambas estão inegavelmente em oposição.

Concordo com o autor em sua consideração de que o capitalismo, conforme praticado (se é que pode haver outra maneira, o que não acredito) não pode levar a um equilíbrio entre produção e consumo sempre ascendentes de um lado e as questões ambientais de outro. Obviamente a maximização de lucros é o que move a empresa privada de modo geral, e exigir algo diferente (ou seja, pedir que uma mesma estrutura produza novas ideologias e práticas) seria um contra-senso. Talvez com o crescimento do tom apocalíptico de alguns grupos da sociedade civil em favor da preservação do meio ambiente e dos riscos de não o fazer e também com a gradual (espero eu) rejeição ao modo de vida atual (tanto no nível macro quanto micro) tal questão, de vital importância, ganhe cada vez mais peso. Mas isso é outra história, é só um pouco de pensamento positivo...

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

depois (e ainda)

(...)

"O que é esse labirinto em que você se tornou?

Não encontro mais abrigo

O que era meu lugar se tornou território inimigo"
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é de 2007, mas bem que poderia ser de hoje mesmo, não?

[ainda me perco entre análises e romances]

sábado, 13 de fevereiro de 2010

na volta (ou ainda mais do mesmo)

"seu burocratazinho de merda! achou que ficaria bem, escondido atrás dessas palavras inertes? atrás do dicionário e da estrutura gramatical da língua?
que podem fazer elas por você?

"está entorpecido permanentemente pela falsa segurança que elas te passam.
as palavras são a degenerescência da alma (e eu próprio me mutilo ao dizer isto).
quer ser ouvido? quer que te entendam?
que se sensibilizem pelo seu drama de homem comum, de cidadão médio? não com palavras.

"no máximo terá uma resposta, tão inorgânica e fria quanto não poderia deixar de ser.
no máximo se tornará a auto-falsificação disso que é por pouco tempo e que logo deixará de ser.
no máximo se tornará risível, se tornará simplorio e quererá morrer antes que se dê conta.
ora, prefira bombas em embaixadas. o gesto ensandecido! homens-bomba são ouvidos, urros guturais, olhares fixos, o suor frio e o coração em disparada também o são. o movimento já trôpego, mas ritmado de dois corpos. o que não é dito move o mundo!

"as palavras?
ah sim, ela enchem os jornais.
mas nem por isso se torna ele mais eficaz em sua função efetiva
(de aquecer corpos numa noite fria)."




sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

no ponto

- Meu amor,
Eu preciso te dizer uma coisa.
Não é boa, nem má, é uma coisa.
É difícil de explicar, é uma coisa
Que acontece comigo.

Eu só sou sentimental quando eu me fodo!"

(Sentimental/ Ecos Falsos)

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E quem há de dizer que não?
Que mais poderia ser dito diante de tais argumentos?



quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

um pouco sobre questões de gênero e o determinismo biológico

"A medida de sua amplitude surgiu com a revivescência do movimento feminista , do qual várias ideólogas chegaram perto de afirmar que todas as diferenças mentais entre homens e mulheres eram essencialmente determinadas pela cultura, ou seja, ambientais. Na verdade, a substituição, que entrou na moda, do termo 'sexo' por 'gênero', implicava a crença em que 'mulher' era não tanto uma categoria biológicaquanto um papel social. Um cientista que tentasse investigar esses temas sensíveis sabia estar em campo minado político."


"Os sóciobiólogos, ou os que popularizavam suas descobertas, sugeriam que as características (masculinas) herdadas dos milênios durante os quais o homem primitivo fora selecionado para adaptar-se , como caçador, a uma existência mais predatória em habitats abertos (Wilson, 1977) ainda dominavam nossa existência social."


(HOBSBAWN, Eric. Era dos Extremos: O Breve Século XX, pág. 533, 534. Editora Companhia das Letras)

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Alguns comentários sobre as questões colocadas nos trechos extraídos acima:

1) Realmente, é bem percepitível o esforço de teóricas feministas, principalmente a partir da década de 70, de erodir a noção fortemente arraigada de que homem e mulher em seu comportamento e maneira de se relacionar eram dois seres naturais, e portanto, imutáveis em sua inserção social. Chegou-se na época a extremos ideológicos que visavam quase uma sociedade andrógena, defendendo inclusive que a gravidez não mais devesse ser um atributo femino, mas sim que se desse em laboratórios (vale aqui mais do que o exemplo, a ideia mais ampla que a permeia). De qualquer forma o que prevaleceu (e acho que acertadamente) foi a redefinição dos dois "sexos" (agora gêneros), enquanto realidades biológicas sim (ou seja, havendo diferenças que pudessem ser atribuídas ao ser masculino e feminino), mas também de forma irrefutável como papéis sociais, explicados e justificados sobre bases culturais.

Existem esses dois seres reconhecidamente diferente, porém e mais importante é como as culturas dão significados diversos a essas diferenças, como dão contornos os mais variados a ambos de acordo com o "universo simbólico" do qual fazem parte. Uma série de autores, a começar pela antropóloga Margareth Mead em "Sexo e Temperamento", buscam demonstrar como o comportamento esperado (enquanto natural) para homens e mulheres varia entre uma sociedade e outra. O esforço era (e ainda é) justamente questionar a ordem das coisas naturalizada e justificada em termos biológicos e trazer à tona, como já dito, seu caráter social e portanto, questionável e mutável. A "mulher" (esse conceito abstrato) passa cada vez mais a tomar corpo enquanto agente político, denunciando a desigualdade sofrida frente ao homem e reivindicando uma nova inserção na sociedade, sendo que tal movimento só foi possível na medida em que se desconstruiu a noção de mulher, na qual tudo se justificava em vista de sua natureza.

Por outro lado, a própria força que o movimento feminino alcançou no decorrer das décadas trouxe complicações para os estudos voltados de alguma forma para os gêneros, mostrando o quanto a ciência está imbricada com a política, sendo influenciada e influenciando. Como exposto no excerto acima, adentrar tal terreno é estar num campo minado.

2) Acho interessante (no mau sentido) a quantidade de explicações sociobiológicas que recebemos o tempo todo e buscam que justificar diversos aspectos do comportamento humano. Por que comemos demais (ou de menos), por que mentimos, por que fazemos assim ou assado determinadas coisas, entre muitas outras. Diariamente jornais e revistas dão destaque a alguma nova teoria. Pior ainda quando são para explicar o porquê das diferenças entre homens e mulheres. Vira e mexe a ciência propõe-se a tentar explicar por seus meios o comportamento mais variados de homens e mulheres (principalmente temas como traição, atração sexual, comportamento sexual, etc). Tentam dar bases naturais a características supostamente femininas (fragilidade, docilidade, submissão) ou masculinas (agresividade, dominação). Ou ainda fazem um ligação direta entre nós e o homem pré-histórico ("somos/fazemos assim, por que nossos antepassados também eram/faziam assim"). Acho que seria muito radical negar totalmente a validade dessas explicação. Porém, tenho certeza que tal "ciência" é utilizada em demasia, como um atalho para elucidar o comportamento humano. É mais fácil justificar determinada característica com base naquilo que não temos controle (como nos nossos genes e no próprio funcionamento do nosso corpo) do que estabelecer sua contigência social e política.

Como já disseram muitos antes, a cultura é a lente pela qual vemos o mundo. A maneira como vemos e lidamos com nós mesmo e com o(s) outro(s) não é dada deterministicamente pela natureza humana, mas está indissociada dos valores e da visão de mundo que tenho para mim e que compartilho com os que me rodeiam (num duplo e simultâneo processo, no qual sou influenciado pelo mundo exterior, enquanto pertencente a ele, mas também na qual minha visão individual do mundo toma forma).

terça-feira, 2 de fevereiro de 2010


"[...] Para não falar do candidato a campeão mundial de desigualdade econômica, o Brasil. Nesse monumento de injustiça social, os 20% mais pobres da população dividiam entre si 2,5% da renda total da nação, enquanto os 20% mais ricos ficavam com quase dois terços dessa renda (UN World Development, 1992, pp. 276-7; Human Development, 1991, pp. 152-3, 186)."

(HOBSBAWN, Eric. Era dos Extremos: O Breve Século XX, pág. 397. Editora Companhia das Letras)


Não que essa informação seja exatamente uma novidade, mas lê-la colocada dessa maneira, ainda mais evidenciando-se a posição de nosso país como campeão (ou quase) de desigualdade, salta às vistas e choca. Veja bem, não é questão de pobreza, mas sim de concentração excessiva de renda.

Ainda que seja difícil ter a real noção desse problema em sua abrangência (que remete às origens e ao desenvolvimento do Brasil enquanto nação) e em seus efeitos práticos, se só olharmos a proporção de azul e de amarelo entre o primeiro e o segundo gráficos (feitos porcamente por mim) já nos permite visualizar o abismo que se forma entre as camadas sociais que compõem o Brasil. Fosse um gráfico sobre a divisão de biscoitos (desculpe pelo exemplo), 20 pessoas ficariam com 2,5 biscoitos enquanto outras 20 teriam 65 para si. Seria simples se isso não determinasse quem vive e quem morre (ou sobrevive) em nossa sociedade. Sim, não é questão de partilha de bens de luxo e comodidade; trata-se de acesso a meios básico e indispensáveis de sobrevivência.

Esses dados são do início da década de 90, pode ser que alguma coisa tenha mudado, porém não acredito que o alerta deva ser menor nos dias de hoje. Ainda mais que tal cenário é mantido por grupos que tentam legitimá-lo por diversos meios, seja pela moral, pela religião ou pela ideologia no livre mercado e no laissez faire. Defensores do status quo não titubeiam em criminalizar a pobreza de forma irrestrita, reforçando esteriótipos e preconceitos há muito difundidos. Cinicamente mascaram as origens dessa desigualdade sob o discurso reificante do neoliberalismo.

Enfim, não queria que soasse panfletário ou que parecesse uma questão simples. Não é. Mas também não concordo que convivamos diariamente com essa situação que muitas vezes passa quase despercebida, silenciosos que são os que sofrem seus efeitos. Independente de qualquer coisa - ideologia, orientação política, religião, etc... - não é justificável que tal estrutura social se matenha.

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

161

Sucata de alma vendida pelo peso do corpo,
Se algum guindaste te eleva é para te despejar...
Nenhum guindaste te eleva senão para te baixar.

Olho analiticamente, sem querer, o que romantizo sem querer...


(Pessoa, Fernando; Poesia de Álvaro de Campos)

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e no fim das contas nem análise e nem romance...