terça-feira, 29 de junho de 2010

sobre bagunças [ou não]

estava tudo um grande bagunça...

é que eu, inadvertidamente, abri esse grande armário no qual havia guardado de qualquer jeito um monte de coisa e tudo acabou desmoronando em cima de mim. é... no furor de me ver livre, soquei da maneira que pude aquele monte de coisas onde coubesse.

por um lado foi bom que tudo caísse sobre mim. não poderia deixar daquela maneira e mais cedo ou mais tarde teria que tentar dar alguma ordem àquilo. a princípio senti uma grande angústia, uma vontade de desistir, mas tempo e paciência ajudam bastante nessas horas!

não sei direito até que ponto consegui fazê-lo (talvez alguns objetos tenham caído em cantos que não posso ver agora), mas sei que está melhor agora. joguei uma boa parte fora e o que guardei de volta está devidamente acondicionado em caixas fechadas com etiquetas indicando "coisas velhas". ainda faz sentido mantê-las, mas somente como recordações.

[e depois, ainda esquecerei datas e nomes]

terça-feira, 22 de junho de 2010

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"Said the hero in the story
'It is mightier than swords
I could kill you sure
But I could only make you cry with these words'".
(Get Me Away From Here, I'm Dying/ Belle and Sebastian)

"Nenhum metal pode perfurar o coração com tanta força quanto um ponto final colocado no lugar certo"
(Isaac Bábel)
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Ainda sobre essa coisa toda de palavras (e pontos finais), a força que elas contêm e sua capacidade de mover o mundo (e protagonizar muitos outros acontecimentos menores e ainda assim relevantes).

Sim, pode-se matar com espadas. Pode-se matar de muitas outras maneiras. É um ato relativamente simples e sem mistérios. Muitos animais matam outros animais o tempo todo. Não somos exatamente originais ao fazê-lo. Mas a capacidade de fazer chorar com palavras sim é algo próprio do ser humano. É a colisão de existências a princípio separadas umas das outras. É fazer-se presente frente ao outro da maneira mais contundente possível. Tomar de assalto seus sentidos e seus pensamentos...

Gosto desses dos dois trechos acima justamente por evidenciarem isso. Como algo imaterial, que não existe senão simbolicamente e por convenção, pode ter toda essa efetividade latente. Como podemos tocar um outro distante e praticamente inacessível por meio do que se diz ou do que se escreve. Sim, se fôssemos ilhas as palavras seriam pequenos barcos que, ainda que de maneira tímida e pouco eficaz, permitiriam esse contato. Permitiriam que eu pudesse causar reações no outro sem encostá-lo, sem nem mesmo conhecê-lo.

O que é um ponto final (e a escrita de maneira mais geral)? Tudo e nada ao mesmo tempo. Friamente analisado é uma marca (uma mancha), que pode dizer absolutamente nada, não fazer sentido algum. Mas frente aos olhos certos (e ao coração certo?) pode causar as mais diferentes sensações. E é estranho sentir o coração perfurado dessa maneira. Parece loucura quando se lê ou se ouve determinadas palavras (ou ainda certos silêncios) e as sentimos como se elas fossem vivas, ou como se ali pudessemos presenciar uma vida, no sentido mais material e pungente possível. Um soco no estômago ou o chão perdendo sua consistência sob pernas bambas... Coisas "inventadas" que tem a força de coisas "reais".

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acho que complementam:

http://carbonoeamoniaco.blogspot.com/2010/04/urgentissimo.html

http://carbonoeamoniaco.blogspot.com/2010/04/ainda-sobre-urgencia.html

sexta-feira, 11 de junho de 2010

duas pernas ocas (ou pausa para o sentimento do mundo)

- amputaram-me. não tenho mais uma terceira perna e sinto toda a sua ausência. tenho dificuldade em me manter ereto e firme. sem ela não me encontro, não estou mais sempre aqui.

- respirar o ar da manhã de são paulo é algo difícil, posto que faz frio e o dia já nasce estragado. mas eu não o jogo fora, como se poderia fazer com uma fruta. mordo, mastigo, engulo, digiro... sem pensar em nada [e isso até o torna mais belo].

- titubeio em duas pernas, mas sinto uma profunda dignidade em manter-me assim. a cada passo que dou uma espécie de orgulho infantil me corroi por dentro e me reconstroi por fora. e isso me alivia!

- enfim, tenho um retrato e algo na lembrança. mais ainda: a expectativa de voltar a ser alguém que eu nunca fui.
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http://carbonoeamoniaco.blogspot.com/2010/05/agora-percebo-que-estamos-amputados-e.html

http://carbonoeamoniaco.blogspot.com/2010/06/perdi-alguma-coisa-que-me-era-essencial.html

quinta-feira, 10 de junho de 2010

duas pernas e o sentimento do mundo


"perdi alguma coisa que me era essencial, e que já não me é mais. não me é necessária, assim como se eu tivesse perdido uma terceira perna que até então me impossibilitava de andar mas que fazia de mim um tripé estável. essa terceira perna eu perdi. e voltei a seu uma pessoa que nunca fui. voltei a ter o que nunca tive: apenas duas pernas. sei que somente com duas pernas é que posso caminhar. mas a ausência inútil da terceira me faz falta e me assusta, era ela que fazia de mim uma coisa encontrável por mim mesma, e sem sequer precisar me procurar."


(Lispector, Clarice. A Paixão Segundo G.H., págs. 09 e 10. Editora Rocco: 2009)

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Poxa Clarice, logo nas primeiras páginas vem me jogar isso na cara!? Poderia ter esperado um pouco mais...

quarta-feira, 9 de junho de 2010

pausa oca

"Agora percebo que estamos amputados e frios.
Não tenho voz de queixa pessoal, não sou
um homem destroçado vagueando na praia.
Muitos procuram São Paulo no ar e se concentram,
aura secreta na respiração da cidade.
É um retrato, somente um retrato,
algo nos jornais, na lembrança,
o dia estragado como uma fruta,
um véu baixando, um ríctus
o desejo de não conversar. É sobretudo uma pausa oca
e além de todo vinagre."

(Carlos Drummond de Andrade)
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agora percebo... mas ainda creio que seja melhor assim (hesito, porém).

e eu sinto cada palavra, como se fosse um corte.

[havia escrito antes, num devaneio, sobre a importância de se arrancar os dedos junto com os aneis (carbonoeamoniaco.blogspot.com/2010/05/intempestivo.html). reconheço, porém que, nos "percebermos amputados e frios" atormenta... não nego que a ausência (de algo que tinhamos por nosso) doi. só que mais doloroso seria mantê-los para lembrar-nos os aneis perdidos. e quando finalmente houver um novo dia (depois da "pausa oca e além de todo vinagre") seremos finalmente outros. afinal, é da carne viva que surge a pele nova, né? (ou será sempre cicatriz?)]

terça-feira, 8 de junho de 2010

teu poema

o teu poema faço agora.
necessito fazê-lo
ou cravar esta caneta muito fundo no teu peito
(o que te doesse mais!)
para que de alguma forma
me compreenda, me absorva.
que por um breve momento fosse eu de fato um poeta
(como esses que há no mundo)
e te fizesse chorar com um ponto final
certeiro,
cravado no papel ou em ti.
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e suas lágrimas seriam, para mim, um ponto final?

quarta-feira, 2 de junho de 2010

cardiológico

E aí suplicam: “Pára de amarrar o coração em tudo, em qualquer coisa. Você coloca o coração em qualquer coisa!” O que vem a seguir sou eu brava com todos eles porque acho que devo amarrar o coração onde eu bem entender, uma vez que o órgão é meu. Olham pra mim com a cerveja transbordando pelos olhos e me chamam por um nome que inventaram…e balançam a cabeça. Desistiram. Preferi ficar quieta na mesa, mas eu sei, e eles sabem que eu sei, que o coração de cada um deles também está em qualquer coisa. Nunca nos pagam o que merecemos e seguimos em frente. Se certos dedos estalarem, lá estaremos nós. A ciclotimia da vida nos une numa mesa, sentados em algum sofá, não importa onde – e se for na casa de alguém, eu insisto em passar na padaria e comprar um pote de sorvete que ficará para sempre esquecido no freezer. Igual ao coração amarrado em qualquer coisa. É sempre um descompasso, eu ensinei a alguns: “não aplauda no contratempo!” – sendo que eu mesma faço isso com uma frequência assombrosa, urrando no silêncio e me calando na catarse. Eu virei e falei pra um deles que o meu coração está nas coisas certas, pois se não o deixo por aí, como suportar a rotina? Há uns cacos na escadaria do Teatro Municipal, um milhão de pedaços na Cardeal Arcoverde, na Casa Verde, naquela praia, pelas estradas, em outras cidades, na Serra da Graciosa, na Mooca, sob o poste de luz* e dentro da sua guitarra, não importa que você desafine. Está ali quando eles posam pra mim, sorriem pra mim, reluzem pra mim e eu tenho que fazer cálculos e mais cálculos pra saber se haverá chance para o equipamento melhor; está na porta do elevador pantográfico, está em você, em você e nele, eu não sei o que sobrou dele em mim. Mas o de vocês também nunca está aí. Por isso enchemos os copos uns dos outros, já notou que ninguém enche o próprio copo? É um preenchendo o vazio daquele que está ao lado, portanto não torne a dizer que só eu esqueço a porra do coração amarrado em qualquer coisa. Porque o meu está em vocês. Posso ficar brava e eu ainda o deixo com todos vocês. Quem trouxer cerveja tosca vai ter que beber cerveja tosca. Hoje vai ser pizza com videogame – e aquilo de sempre. O sorvete está no freezer, se bater aquela vontade de “alguma coisa doce”. E eu continuo por aqui.
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texto sensacional retirado na íntegra daqui ó: http://espressoepuro.wordpress.com/2010/03/31/sabor-flocos/

realmente, se não amarro meu coração em certas coisas como posso suportar a rotina?
o meu, eu amarro onde? [o meu está em vocês...]

terça-feira, 1 de junho de 2010

o fingimento e a poesia

“o que interessa em arte não é a sensibilidade, mas o uso que se faz da sensibilidade. Não o poema de uma verdade, mas a verdade de um poema.”
(Ficções do Interlúdio, pág. 273)


Será que o poeta (ou o artista em geral) realmente sente aquilo que expressa?
Aquilo que chega até nós por seus versos é realmente uma verdade, algo que ocorreu ou ocorre? Faz parte de seus sentimentos, da sua experiência?
Até que ponto o poeta é somente um “fingidor”? Até que ponto ele de fato sente o que expressa?
Essa questão surgiu ao acaso (né, Fernanda?) e realmente é bem interessante (ok, não se pautem por mim para definir o que é interessante ou não...).

De acordo com a citação acima (com a qual eu concordo), é secundário se preocupar se determinado assunto ou sentimento faça parte da experiência pessoal do autor. Se ao falar sobre a infância, por exemplo, ele esteja de fato resgatando a sua própria ou imaginando uma. Entra aqui a possibilidade de se criar ficções, algo central para a literatura: Falar a partir de diversos pontos de vista, atuar, inventar diferentes personalidades. Enfim, criar e se recriar.

Algo próximo do que se vê de maneira brilhante e radical em Fernando Pessoa. Seus heterônimos (e o próprio ortônimo) escrevem e apresentam personalidades diferentes, mas são reais, na medida em que suas obras são realidade. Há “verdade” em seus poemas, independentemente de sua existência física ou da veracidade dos dados biográficos de cada um deles. O próprio autor Fernando Pessoa é colocado em pé de igualdade com os heterônimos, na medida em que não se pode definir com precisão se esse é mais ou menos real, enquanto personalidade, que os outros. Ou seja, por mais que o indivíduo Fernando Pessoa histórico seja real, ele mesmo se isenta de colocar a obra assinada enquanto tal como mais verdadeira do que aquela assinada com outros nomes (e fruto de outras "personalidades").

Ainda assim, não acho que o poema perca sua sensibilidade só pelo fato de não ser um testemunho pessoal do autor ou não expressar exatamente sua existência biográfica. O poema é uma “verdade” em si, possui sua própria beleza enquanto obra. Materializa-se, torna-se uma existência em separado de seu criador a partir do momento em que é exteriorizada. O próprio fingir é uma ferramenta importante e que de maneira nenhuma invalida o poema. Escrever sobre uma infância imaginária, inventar o que quer que seja (sobre si mesmo ou terceiros) ainda assim é dar forma a sensibilidade do momento, é ter a capacidade de traduzir aquilo que há na mente de diferentes maneiras.

Por mais distante que supostamente esteja da realidade do poeta, os sentimentos e sensações que vemos emergir de sua obra nunca são de fato exteriores a ele. Para que possa ser objetivado, colocado no papel, aquilo de alguma forma deve fazer parte da mente do autor. Pode-se escolher os temas mais distantes e inesperados, tomar como foco o ponto de vista de personagens totalmente antagônicos; ainda assim o autor nunca vai conseguir escapar da sua experiência enquanto indivíduo. O que quer que ele escreva, que ele invente, não poderá escapar de sua própria subjetividade. Acho que isso é meio óbvio (dizer que só poderá pensar pela sua cabeça, sentir pelos seus sentidos), mas quero enfatizar que fingir/ inventar/ atuar ainda assim é dar forma aos seus próprios sentimentos. E colocar em prática a "pose", dar novos contornos a si mesmo e ao que se pretende passar. Por mais que, ao falar sobre a infância, o autor não fale da sua própria, é de si que surge aquilo que ele escreve, ou caso ele só reproduza uma opinião exterior, ainda assim ela passa pelo seu “filtro”. Tomar contato com as coisas é ter impressões sobre elas. Expressar esse contato é também expressar suas próprias opiniões e sensações. Há sempre algo de pessoal. Ainda mais na poesia, que permite uma liberdade muito maior no uso da linguagem e na expressão da emoção.

Ou não. E que alguém chegue a conclusões melhores por si mesmo...